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Drama de Ivana comoveu porque o público percebeu que ele era importante

Mauricio Stycer

29/08/2017 21h57


Ao encenar a revelação do drama íntimo de Ivana para a família, no capítulo desta terça-feira (29) de "A Força do Querer", Gloria Perez conseguiu combinar, com rara felicidade, uma história emocionante com uma ação de responsabilidade social.

Foi uma sequência de momentos comoventes.

"Vocês não tiveram uma filha. Eu nasci um menino", disse Ivana (Carol Duarte) diante da família. "Que droga é essa que você tá tomando?", respondeu a mãe, Joyce (Maria Fernanda Cândido), chocada. "Eu só vim aqui perguntar se vocês me aceitam", replicou Ivana, antes de se trancar no quarto e cortar os próprios cabelos – mais um passo para virar Ivan. "Olha mãe. Sou eu. Sou eu de verdade", disse, para desespero de Joyce, que a deitou em seu colo.

A incompreensão de Joyce deu a medida das dificuldades que Ivana vai enfrentar: "Eu não vou desistir de você", disse a mãe, que insistiu em chamar a filha de "princesa". "Você já está desistindo. Você não consegue me enxergar. Você teve dois filhos homens", respondeu Ivana.

Talvez a maior lição que se possa tirar da trama de Ivana na novela é que não basta o assunto ser importante, ele precisa ser percebido pelo público como tal. E isso ocorre por diferentes razões, algumas delas difíceis de captar.

A discussão sobre os direitos LGBT está em um momento de grande evidência. Parte da sociedade parece entender que este tema é necessário e não cabe ficar escondido. Some-se a isso, a curiosidade e o desconhecimento que parecem existir sobre esta questão específica, a da transexualidade.

Também é preciso ressaltar a habilidade que Gloria Perez vem demonstrando na construção da trama e, não menos importante, o mergulho da atriz Carol Duarte no papel de Ivana. Tanto a autora quanto a atriz deram um peso extraordinário a um drama com muitas facetas – da exposição do preconceito (de parentes, amigos e desconhecidos) à superação de dificuldades físicas e emocionais da personagem.

Ainda que combinasse melhor com uma família em situação sócio-econômica mais difícil, a história de Ivana não pareceu forçada ou imposta em "A Força do Querer". Ao contrário, se encaixou e se tornou um elemento interessante, em termos de dramaturgia, dentro da novela e, em particular, do seu núcleo.

Os números de audiência comprovam o acerto da aposta da autora. Tivesse a história de Ivana sido rejeitada pelo público, o Ibope da novela não estaria batendo seguidos recordes. (Atualizado:) Com 42 pontos em São Paulo, "A Força do Querer" registrou o seu segundo melhor resultado nesta terça-feira (veja mais aqui).

Não é fácil ser bem-sucedido na combinação destes dois aspectos – entretenimento e educação – em uma trama de novela. A própria autora, que se orgulha de ter proposto várias ações em diferentes novelas suas, sabe como é difícil, e nem sempre funciona bem, convencer o espectador a se interessar por questões que vão além da pura diversão.

O tráfico internacional de mulheres, carro-chefe de "Salve Jorge" (2012-13), a novela anterior de Gloria Perez, não provocou maior empatia do público. A culpa se deve, em parte, a problemas do próprio texto, repleto de incoerências, e da direção, pouco convincente. Mas, acima de tudo, o drama de Morena (Nanda Costa) não conseguiu tocar o coração do espectador.

Em oposição a este insucesso, a história da personagem Odaísa (Isadora Ribeiro), que procurava o filho Gugu (Luiz Claudio Júnior) em "Explode Coração" (1995-96) é exemplar desta combinação de elementos que tornam uma trama não apenas interessante como necessária. A autora e a Globo se orgulham, com razão, de mais de 60 crianças terem sido encontradas graças à exibição na novela de depoimentos de mães e fotos de filhos desaparecidos.

Só o tempo dirá o quanto a história de Ivana ajudou no esclarecimento e na superação de dramas semelhantes ao da personagem. Mas é possível dizer que, até o momento, o acerto parece enorme.

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Em tempo: A Globo aproveitou o capítulo desta terça para lançar um novo vídeo da campanha institucional Tudo Começa Pelo Respeito, justamente sobre o tema da transexualidade. Veja abaixo:

Tudo começa pelo respeito. É simples assim. #CorpoArtigoIndefinido pic.twitter.com/8ETXgc6s7C

— Globo (@RedeGlobo) 30 de agosto de 2017

Seis personagens que estão fazendo a diferença em "A Força do Querer"

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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