Reta final de “Império” surpreende, mas não tem nexo com o resto da novela
Mauricio Stycer
12/03/2015 05h00
O diálogo entre Zé Pedro (Caio Blat) e Silviano (Othon Bastos), bastante didático, teve a função de tentar convencer o espectador de que esta revelação, muito surpreendente, se justifica diante do que foi exibido nos 200 capítulos anteriores.
O problema é que não se justifica. A rigor, desde que Aguinaldo Silva decidiu que Silviano foi o primeiro marido de Marta (Lilia Cabral) e, pouco depois, que era o pai de Maurílio (Carmo dalla Vecchia), a novela perdeu totalmente a coerência e a lógica.
Por mais eletrizante que esteja sendo esta reta final, qualquer espectador que tenha assistido "Império" desde o início pode listar uma dezena de furos na história. Para aceitar que Zé Pedro é o grande vilão é preciso ignorar mais de 150 capítulos da trama.
Para piorar, ou irritar ainda mais, a reveladora conversa entre Zé Pedro e Silviano, como é praxe em "Império", foi ouvida atrás da porta – neste caso por Lorraine (Dani Barros), que contou para Ismael (Jonas Torres), que a convenceu a contar para José Alfredo (Alexandre Nero) e Marta (Lilia Cabral).
Por falta de imaginação ou preguiça, o autor usou e abusou deste velho clichê (ouvir atrás da porta) para desencadear as mais variadas situações na novela.
Ao ouvir o diálogo em que Zé Pedro diz a Silviano que é Fabricio Melgaço e esclarece quase todos os mistérios de "Império", Lorraine teve um ataque de sinceridade: "A história tá cabeluda demais". É verdade. Cabeluda e sem muito sentido.
Aguinaldo Silva tem consciência disso. Tanto que, em entrevista a "O Globo", justificou-se: "Fiz o que queria: um novelão, um folhetim desvairado. Mas isso não teria sido possível se toda a equipe que participou do trabalho não deixasse o pudor e o senso de ridículo de lado e mergulhasse de cabeça no melodrama e no dramalhão".
"Império" tem várias qualidades dignas de nota (ainda escreverei a respeito). Mas a trama policial, desenvolvida a partir da entrada de Maurílio na história, foi claramente mal planejada e deixou a desejar.
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Sobre o autor
Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).
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