Topo

Fã se diz iludida por Casos de Família: "SBT não precisa viver de mentiras"

Mauricio Stycer

05/02/2015 05h01


Vanessa Silva sempre foi fã do programa "Casos de Família", apresentado por Christina Rocha no SBT. Essa semana, ela me escreveu um longo e-mail. Começa assim:

"Eu sempre assisto porque acontecem coisas engraçadas lá, como no dia em que uma moça disse que queria comprar um 'naitebruque' em alusão a um notebook. Ou porque aprendo coisas, como no dia em que um travesti disse que não podia ir nem no banheiro feminino nem no masculino. E me deu compaixão por essas pessoas que trocam de gênero e não têm um lugar na nossa sociedade."

Vanessa conta que perdeu o encanto pelo programa depois de ler, aqui no blog, uma história publicada no dia 24 de janeiro: Mãe estraga casamento da filha na RedeTV! e pega 3 ex-namorados dela no SBT.

"Parte da graça ou da atração que ele exerce é ser apresentado como um programa com casos verdadeiros. Depois que li seu texto sobre a mãe e filha que foram lá e no programa do João Kleber, parece que algo se quebrou. Fico me perguntando como gente que parece gabaritada como a psicóloga Anahí D'Amico trabalha lá, ou como o programa tem patrocinadores que aceitam isso", escreveu Vanessa.

Para piorar, no último dia de janeiro, um sábado, o SBT reprisou à noite um episódio de "Casos de Família" exibido originalmente em novembro de 2013. O tema era "Minha sogra está fazendo de tudo para acabar com o meu relacionamento".

Conta Vanessa: "Apareceu uma mulher com olhos tão bonitos que me deu vontade de ir xeretar no Facebook. Como a mulher tinha um nome diferenciado, Helke, não foi difícil achar".

Navegando pela página,Vanessa rapidamente constatou que Helke Régis é uma figurante profissional. Na rede social, ela cita trabalhos para inúmeros programas e emissoras – "Pânico na Band", "Legendários" (Record, à dir.), "Casos de Família" (SBT), além de pegadinhas, entre as quais uma das mais famosas já exibidas por Silvio Santos, a do dinossauro (abaixo) que invade um escritório comercial (veja aqui, ela é a primeira "vítima").

"Nem preciso falar que fiquei revoltada. O SBT é um bom canal de TV, o dono tem uma história incrível, não precisa viver de mentiras. Melhor que colocasse nesse horário alguma novela água com açúcar mexicana, ou maratona do Chaves, do que vender um programa como verdadeiro, quando não é", escreve Vanessa.

Helke, com seu próprio nome, interpretou o papel da sogra no "Casos de Família" reprisado no último sábado. "No programa ela diz que tem três filhas, que a mais velha de 18 anos deu este desgosto de namorar um vagabundo e tal… Quando fui ver no Facebook dela, a tal filha não aparece em nenhuma foto, nem é amiga dela".

Continua Vanessa: "E para minha total indignação, Helke convida em seu Facebook os amigos para vê-la na TV, não importando o fato de que ela está interpretando uma personagem enquanto existem pessoas acreditando que aquela é história da vida dela. Lamentável!"

Helke dá a sua versão

Procurada pela repórter Amanda Serra, que fez uma excelente reportagem sobre o assunto (Com cachê de até R$ 200, figurantes alimentam programas de entretenimento), Helke disse: "Não tenho nada a declarar. Qualquer coisa entre em contato com o SBT, me inscrevi pelo site".

A reportagem de Amanda traz o depoimento de outra figurante, Maria Andréia, que revela como conseguiu participar de dois episódios do "Casos de Família" em menos de um ano, contando duas história totalmente diferentes. "Eu vi o escândalo que aquela figurante armou com vocês para ter o momento Geisy Arruda dela", diz Helke. "A mesma é uma charlatã e vocês deram total credibilidade às mentiras dela".

Depois da publicação deste texto, Helke entrou em contato com a redação do UOL e afirmou ser mãe da jovem que aparece no vídeo. "A minha filha é verdadeira, não foi nenhuma armação, a história é verídica. Temos fotos de família que prova. Quando gravamos ela tinha 18 anos, ela é minha filha mais velha e tenho outros dois filhos".

SBT: "A seleção do programa é através de entrevistas e não de detector de mentiras."

O diretor do "Casos de Família", Rafael Bello Lopez, enviou por meio da assessoria do SBT a seguinte nota em resposta aos questionamentos do UOL (os negritos são da emissora):

O SBT esclarece, que a equipe do Programa Casos de Família é composta por 30 pessoas entre produtores, assistentes de produção e estagiários e aproximadamente 40 contatos ou "pesquisadores de rua". Todos eles trabalham pesquisando e procurando histórias na Grande São Paulo, assim como no interior de São Paulo, e algumas vezes até em outros estados. Quando uma história se encaixa em algum tema que o programa está produzindo, um dos produtores junto com o contato ou "pesquisador de rua" vai até a casa desses possíveis participantes para entrevistá-los, coletar os dados e ver que todas as informações são verídicas. Se a história em questão for aprovada pelo funcionário, então é marcado um encontro para levá-los com um motorista do SBT, até a emissora, onde eles são entrevistados novamente, mas desta vez pela equipe de supervisores, que filtra cada detalhe das histórias. O produtor confere todos os documentos de identidade e no final, esses supervisores qualificam o desenvolvimento dos participantes durante a entrevista, assim como a veracidade da história, e aí aprovam ou desaprovam a participação dos possíveis participantes no programa.

Sobre os temas de cada programa, a equipe se reúne a cada semana para fazer um "brainstorm", onde cada um dos produtores entrega uma lista de temas com uma sinopse que explique o assunto, assim como qual é a mensagem que estaríamos levando ao público, baseado na nossa missão social. Outras vezes, algum convidado durante a gravação fala uma frase interessante e aí vira tema, também podem ser sugestões do público, seja pelo site do SBT, pelo telefone ou até na mesma rua.

O Casos de Família tem uma missão social muito clara, por isso todas as histórias são e devem ser reais. No processo de seleção, todos os documentos são conferidos e se os elementos que pertencem ao tema fazem sentido dificilmente pode se comprovar que o participante está criando uma história. A seleção do programa é através de entrevistas e não de detector de mentiras.

Na maioria dos casos, todos possuem mais de uma história em suas vidas e se um convidado participa duas vezes, é porque a sua segunda história é tão interessante quanto a primeira ou até ainda mais. Se essa história encaixar em algum outro tema que o programa está produzindo e aporta alguma mensagem dentro da missão social do programa, a equipe analisa então a possibilidade de trazer esses convidados de novo. Por exemplo, uma esposa pode sofrer violência doméstica e ao mesmo tempo não aceita seu filho homossexual. São duas histórias totalmente diferentes, mas que são vivenciadas pela mesma pessoa.

O SBT deixa claro que os contatos ou "pesquisadores de rua", que chegam a ser quase 40, são selecionados e treinados pelos produtores, eles sabem da ética de seleção e qual é a missão social de Casos de Família. Se algum dos nossos contatos ou "pesquisadores de rua" estiver criando as histórias junto com os possíveis participantes, e a produção de Casos de Família descobrir esse ato, imediatamente dispensa o serviços dos mesmos.

* Este texto foi atualizado às 14h.

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Fã se diz iludida por Casos de Família: "SBT não precisa viver de mentiras" - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.


Newsletter