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Aposta da Globo em autores novatos deixa veteranos em segundo plano

Mauricio Stycer

08/09/2019 05h01

O autor Silvio de Abreu, diretor de Teledramaturgia da Globo desde o final de 2014

A estreia de "Éramos Seis" no final de setembro será a primeira novela que Angela Chaves assina sozinha na Globo. Segundo as contas da emissora já são quase 20 novos autores desde que Silvio de Abreu assumiu a direção de Teledramaturgia, no final de 2014. Ela foi coautora, junto com Alessandra Poggi, da supersérie "Os Dias Eram Assim" (2017).

Há um mês, durante a inauguração dos novos estúdios da Globo, Silvio festejou: "Fico muito feliz de, desde ter assumido aqui, já ter revelado 17, 18 novos autores. Porque eu achava que uma das coisas que faria a novela ter continuidade seria ter novos autores, novas ideias, porque senão o gênero iria morrer".

A lista de "novos autores" inclui vários roteiristas que já colaboravam há anos com autores veteranos da Globo. Quinze destes novatos são: Suzana Pires e Júlio Fischer ("Sol Nascente"), Thereza Falcão e Alessandro Marson ("Novo Mundo"), Ângela Chaves e Alessandra Poggi ("Os Dias Eram Assim"), Paula Amaral ("Verão 90"), Daniel Adjafre ("Deus Salve o Rei"), Claudia Souto ("Pega Pega"), Maria Helena Nascimento ("Rock Story"), Mario Teixeira ("Liberdade, Liberdade"), Manuela Dias ("Ligações Perigosas"), Bruno Luperi ("Velho Chico"), Maria Camargo ("Dois Irmãos") e Cao Hamburger ("Malhação, Viva a Diferença").

Silvio de Abreu não mencionou, mas a aposta em novos autores tem, também, uma razão econômica. Com contratos antigos, os autores veteranos, muitos há mais de três décadas na emissora, custam caro. Alguns produzem uma novela a cada três anos; outros, nem isso. E ganham mesmo nos períodos em que não estão no ar. Os novatos ganham muito menos, claro.

Nestes quase cinco anos à frente da Teledramaturgia, Silvio rejeitou ou engavetou inúmeros projetos de novelas e séries apresentados por autores veteranos. A dificuldade em emplacar novos projetos atinge nomes como Gilberto Braga, Benedito Ruy Barbosa e Walter Negrão, que conseguiram aprovar apenas um título cada, respectivamente, "Babilônia", "Velho Chico" e "Sol Nascente". Para não falar de Manoel Carlos, cujo último trabalho, "Em Família", é anterior à chegada do novo executivo ao cargo.

Não passou despercebido que neste período Silvio de Abreu aprovou o "remake" de duas novelas suas, no que pode ser considerada uma ação em causa própria. Além de "Éramos Seis", escrita em parceria com Rubens Ewald Filho e exibida pelo SBT em 1994, ele também deu sinal verde para "Haja Coração" (2016), reescrita por Daniel Ortiz com base em "Sassaricando" (1987-88). Em 2012, antes de assumir o cargo, ele próprio reescreveu o remake de outra trama sua, "Guerra dos Sexos" (1983).

Benedito Ruy Barbosa, após três anos de contrato sem conseguir emplacar nada, contou a Flavio Ricco em agosto que vai se aposentar. O público não vê algo seu na emissora desde "Velho Chico" (2016).

Walter Negrão tem contrato até 2020 e a promessa de fazer uma série no ano que vem, mas pouco se sabe a respeito. Seu último trabalho, em parceria como os novatos Suzana Pires, Júlio Fischer, foi "Sol Nascente" (2016-17).

Após algumas rejeições, Gilberto Braga conseguiu a aprovação para escrever, junto com Denise Bandeira, uma novela das 18h, ambientada nos anos 1920, baseada no romance "Vanity Fair", de William Makepeace Thackeray. Fala-se de um folhetim de 100 capítulos com estreia programada para o segundo semestre de 2020. O público não vê nada do autor desde "Babilônia" (2015).

O caso de Gloria Perez é o mais curioso de todos. Após o sucesso de "A Força do Querer" (2017), a autora foi convidada por Silvio de Abreu, em fevereiro de 2018, a supervisionar a criação de séries da emissora.

Ao longo de mais de um ano, apenas dois novos projetos que contaram com a sua supervisão direta foram aprovados, a segunda temporada de "Os Experientes", escrita por vários autores, e "Eu, Minha Avó e a Boi", que será feita por Miguel Falabella – outro veterano, aliás, que já fala em deixar a emissora porque não consegue aprovação para os seus projetos.

No início de abril de 2019, ainda durante a gestão de Glória na chamada Casa dos Roteiristas, houve o anúncio do fim da série "Sob Pressão" após a terceira temporada, sob o argumento de que "a exemplo do que ocorre com diversos outros produtos, os ciclos se encerram e novos projetos surgem nessa nossa grade dinâmica e diversa". Em julho, os planos mudaram e a Globo confirmou que a série vai continuar.

No final de abril deste ano, Gloria saiu da área de séries para cuidar da "supervisão e mentoria", nas palavras da Globo, de Alessandra Poggi, que escrevia uma novela para as 21h. Um mês depois, a autora divulgou no Twitter que está escrevendo a sua própria novela, sobre a relação dos homens com a tecnologia. Em julho, foi divulgado que o projeto de Alessandra Poggi virou uma novela das 18h, programado para 2021.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

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