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“Record gosta mais de me pagar do que de me ver trabalhando”, diz autor

Mauricio Stycer

18/02/2019 05h01


Contratado da Record desde 2005, Marcílio Moraes conseguiu nestes 14 anos que a emissora exibisse três novelas – "Essas Mulheres" (2005), "Vidas Opostas" (2006) e "Ribeirão do Tempo" (2010) – e três séries de sua autoria – "A Lei e o Crime" (2009), "Fora de Controle" (2012) e "Plano Alto" (2014).

Não é pouca coisa. Carlos Lombardi, por exemplo, só conseguiu emplacar um projeto de novela ("Pecado Mortal") em cinco anos de contrato. Mas Marcílio sente que está sendo mal aproveitado. Há cinco anos, não consegue sinal verde para um projeto novo. A segunda temporada de "Planto Alto" chegou a ser escrita, mas foi engavetada. O mais recente trabalho, a série "Pigmaleão do Brejo", aprovado no primeiro semestre de 2018, também já foi escrito, mas segue sem previsão de produção.

É natural que Marcílio esteja insatisfeito com esta situação. Em 2018, fiz uma entrevista com ele a propósito do lançamento do romance "Entre as estrelas: Aquiles", no qual o protagonista é um autor de novelas, e ele disse: "A Globo deu certo, fundamentalmente, porque soube valorizar o autor-roteirista".

Nestes últimos dias Marcílio voltou a falar das suas dificuldades na Record. O pretexto foi uma notícia sobre o bom desempenho que a reprise de "Essas Mulheres" vem registrando no Ibope. O autor observou em sua página no Facebook: "Um trabalho que se sustentou no texto. Só para citar um exemplo: não tínhamos externas. Para ser boa, uma novela não precisa mais do que dramaturgia sofisticada, bons atores e boa direção. Grandes produções nada significam. Infelizmente, a TV Record não me dá mais espaço, embora me mantenha sob contrato."

O texto mereceu cerca de 100 comentários. Bem-humorado, Marcílio teve o cuidado de responder a uns dez. E fez uma série de observações curiosas sobre a sua relação com a emissora. A uma leitora que disse "Que a Record abra os olhos, né?",ele respondeu: "O bolso eles abrem, me mantendo sob contrato, aliás, muito bom. Abrir os olhos deve ser mais difícil. Ahahahah"

Outro leitor observou, após elogiar as novelas de Marcílio: "É um desperdício você fora da teledramaturgia. Enquanto isso, a Record se afoga nas cansadas adaptações bíblicas." Marcílio respondeu: "Me pagam regiamente para que eu fique assistindo as reprises das minhas próprias novelas."

"O que está havendo com a cabeça do povo da Record que não gravam novela e nem seriado seu?", quis saber um fã. "Tem que perguntar para eles, que me pagam muito bem e não usam o meu trabalho", respondeu. Irônico, explicou à leitora que quis saber por que não escreve mais: "Acho que gostam mais de me pagar do que me ver trabalhando. Ahahah"

Outro disse: "Meu amigo, também não entendo. O que acontece?" E Marcílio fez piada: "Lembra daquela expressão: pergunta pro Bispo? É o caso. Ahahahah"

Por fim, uma leitora sugeriu que o projeto de "Pigmaleão do Brejo" se tornasse uma novela. O autor explicou que o projeto original era de uma novela, mas a emissora não aprovou. "Aí eu propus fazer uma série, para salvar o trabalho".

E acrescentou: "O problema da Record é que não há planejamento, nem consistência nas decisões. A Record poderia perfeitamente estar hoje no mesmo nível da Globo, em termos de audiência, faturamento, prestígio e presença nacional. Não está por insuficiência de gestão."

Engrosso o coro: Record, coloque o Marcílio para trabalhar.

Em tempo: Em contato com o blog, após a publicação deste texto, Marcílio Moraes comentou: "Acho que a minha atitude é um desabafo e, digamos, uma prestação de contas com uma porção de gente que gosta do meu trabalho. Essas pessoas sempre perguntam: o que você está fazendo? Por que não escreve mais? Eu quis explicar que não estou morto nem incapacitado, apesar da idade avançada. Continuo escrevendo, tenho projetos. Não é minha cabeça que está fora do ar, são apenas minhas séries e novelas. O tempo vai passando e o que eu quero é que não rezem por mim antes do tempo… ahahahahahahh."

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.