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Por que a piada ofensiva de César Menotti foi ao ar em um programa gravado?

Mauricio Stycer

04/06/2018 13h33


A péssima repercussão de uma piada contada por César Menotti no "Altas Horas" deste sábado (02) levou o cantor no dia seguinte a publicar um vídeo pedindo "humildemente perdão" para quem se ofendeu.

Diante do apresentador Serginho Groisman, Menotti contou que, certa vez, em um show realizado em um presídio, fãs pediam músicas que ele e Fabiano não sabiam cantar. "Eu falei: 'Desculpa, é que realmente a gente não sabe cantar nenhum samba'. E o Fabiano (disse): 'E tem mais, na minha opinião, samba é música de bandido'."

Todos riram – Serginho, a plateia e os demais convidados da noite.

"Ontem eu contei um 'causo' no programa do Serginho Groisman e muitas pessoas, por terem visto apenas um trecho da edição que foi feita, e não todo o contexto, acabaram se ofendendo", disse Menotti em seu pedido de desculpas.

Assistindo ao programa, é possível imaginar que se tratava de uma piada (ruim e ofensiva). Não sei o que deixou de ir ao ar (o "contexto", como diz o cantor), mas chama a atenção o fato de que o comentário não provocou nenhuma contestação de quem a ouviu no palco, em especial, do apresentador. Esse fato aumentou o incômodo de quem assistiu ao programa em casa.

Por que este trecho do "Altas Horas" foi ao ar? Não é a primeira vez que "acidentes" deste tipo ocorrem em programas gravados. Arrisco duas opções:

1. Ninguém presente na gravação viu, de fato, qualquer problema no "causo" contado por Menotti. E ninguém, ao editar o programa, achou que a piada poderia ter repercussão negativa.

2. O potencial "polêmico" do comentário de Menotti foi notado pela equipe do programa, mas decidiu-se levá-lo ao ar justamente para causar polêmica e gerar repercussão para o "Altas Horas"

Se a primeira opção for a correta, valeria a pena a Globo investir na criação de um cargo semelhante ao que Chico Buarque sugeriu, em tom da galhofa, ao governo do então presidente Lula, em 2004: o "Ministério do Vai dar Merda". Chico explicou ao jornalista Rodolfo Fernandes, de "O Globo", a sua ideia:

"A cada decisão importante, esse ministro seria chamado. Se o governo decide recadastrar os idosos, o Lula convoca o ministro e pergunta: 'Vai dar merda?' O ministro analisa o caso, vê que os velhinhos vão ser humilhados nas filas, e responde: 'Vai dar merda'. No caso da briga com o 'New York Times', era só chamar esse ministro e perguntar: 'Vamos expulsar o jornalista. Vai dar merda?' O cara ia analisar e responder: 'Vai dar merda'."

Agora, se a intenção é mesmo criar polêmica, a emissora precisa de outro tipo de conselho. Como sabemos, a dificuldade de compreender piadas, boas ou ruins, é cada vez maior. Não foi bom para a imagem de Serginho Groisman aparecer gargalhando depois de ouvir Menotti dizer que "samba é música de bandido".

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

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