Miele começou como “quebra galho” e foi um “faz tudo” no show business
Luiz Carlos Miele (1938-2015) deixou um livro de memórias, "Poeira de Estrelas" (Ediouro), publicado em 2004. É um apanhado de histórias e causos divertidos, que dão uma boa ideia de sua trajetória artística – fez praticamente de tudo em sua carreira como produtor de shows, ator, humorista e, não menos importante, boêmio.
"Este livro não contém nenhum mentira, mas as verdades foram melhoradas um bocado", avisa logo na primeira página, antes de começar a emendar uma história mais engraçada que a outra.
O livro é caótico, no bom sentido – um pouco como foi a sua carreira. Não obedece a nenhuma cronologia, nem está preocupado em explicar muito o contexto das situações que viveu. Em uma mesma página, ele conta histórias passadas em três décadas diferentes.
Filho de uma cantora e atriz de rádio, Regina Macedo, Miele começou a sua carreira ainda criança, na rádio Excelsior, em um programa intitulado "Meu filho, meu orgulho". Segundo o seu relato, o menino contratado para fazer o programa ficou muito nervoso e não conseguiu gravar.
"Foi quando minha mãe, que havia recebido meus últimos boletins do colégio, que antecipavam que eu estava longe dos destinos dos médicos, advogados, economistas e presidentes da República, resolveu que era hora de eu tentar outra coisa". "Acho que meu filho pode quebrar esse galho", teria dito Regina, dando o pontapé inicial na carreira do filho.
Miele conheceu ou foi amigo de todo mundo que importa no Rio e em São Paulo, a partir dos anos 60, da televisão, do Cinema Novo, da Bossa Nova e muito mais – de Vinicius de Moraes a Hebe Camargo, de Daniel Filho a Roberto Carlos.
Paquerou, ou foi paquerado, por Liza Minnelli, entrevistou Gene Kelly, foi "chapa" de Stevie Wonder… Fez tudo no show business.
Em parceria com Ronaldo Bôscoli (1928-1994), produziu centenas de shows – os mais importantes deles os de Elis Regina (1945-1982): "Foi a única artista com cujo talento não me acostumei", diz no livro.
Miele fala pouco de seus trabalhos na televisão. "Quebrou um galho", como diria a sua mãe, nas mais variadas produções – desde contracenar com Topo Gigio em "Mister Show" (1970), até apresentar festivais de música ("MPB 80"), passando pelos principais humorísticos da Globo, como "Faça Humor, Não Faça Guerra" (1970), "Satiricom" (1973) e "Planeta dos Homens" (1976).
Também trabalhou na Manchete, em "Miele & Cia." e "Ele & Ela", com Leila Richers. E, quem não se lembra, comandou um clássico trash no SBT, em 1991-92, o programa "Cocktail".
Curiosamente, Miele fala pouco ou nada destes programas em "Poeira de Estrelas". E como o livro é de 2004, não trata do último período de sua vida, quando retomou a carreira na TV como ator e humorista, primeiro como o advogado Wexler, em "Mandrake" (HBO), depois fazendo participações especiais em algumas séries e novelas da Globo, como "Brado Retumbante", "Tapas e Beijos", "Geração Brasil" e "A Teia".
Falando da morte de vários amigos, a certa altura do livro, Miele observa que pediu para registrarem em seu epitáfio: "Aqui jaz, absolutamente contra a vontade, Luiz Carlos d´Ugo Miele". De fato, "Poeira de Estrelas" confirma a alegria de viver que Miele sempre deixou transparecer.
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