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Público de hoje odiaria "Vale Tudo", diz diretor de "Babilônia"

Mauricio Stycer

28/05/2015 11h23

oficioemcenadenniscarvalho

Em entrevista ao programa "Ofício em Cena", exibido pela GloboNews, Dennis Carvalho, diretor de "Babilônia", fez um desabafo sobre a rejeição "violenta", segundo ele, que a novela está sofrendo.

Apresentado por Bianca Ramoneda, o programa é gravado no Projac, na Globo, com uma plateia formada por estudantes de teatro, além de atores e técnicos da própria emissora. O modelo é muito semelhante ao talk show "Inside the Actors Studio", comandado por James Lipton há mais de 20 anos na TV americana.

Reproduzo abaixo a íntegra das respostas de Dennis Carvalho à apresentadora e a um estudante, quando ele aproveita para fazer o seu desabafo. Não concordo com a ideia de que a "culpa" pelo fracasso de "Babilônia" é do público, mas o diretor faz considerações muito interessantes sobre o assunto. Vale a leitura:

Bianca Ramoneda: Como você faz um balanço entre ousadia e conservadorismo na televisão? Hoje você já tem noção do que o público vai gostar?
Dennis Carvalho: ('Babilônia') É uma novela muito parecida com várias outras que já fiz, em matéria de maldade, vilania, de sexo, de chantagem, corrupção – até de homossexualismo, que já tinha em 'Brilhante'. E o público rejeitou violentamente o começo dessa novela. Fizeram uma pesquisa e as pessoas diziam: 'Ah, tem muita maldade!'. 'Ah, tem muita corrupção!' Coisa que sempre teve em toda novela. Houve uma certa regressão do conceito das pessoas, de politicamente correto. 'Vale Tudo', 'Celebridade' não passariam hoje. As pessoas odiariam. Tudo tem que ser politicamente correto. Aí as coisas ficam chatas, ficam babacas, ficam caretas. Novela é diversão, é folhetim. É tudo de mentirinha. As pessoas falam: 'Ah, já tem muita maldade na vida, não quero chegar em casa e ver mais maldade'. Isso é diversão, mentirinha, ficção. Não é documentário. Ai falam: 'Não quero que meus filhos vejam isso'. Primeiro, criança não é pra ver novela, dependendo do horário. Segundo, é muito fácil botar a criança do lado da televisão e esquecer da educação da criança. E ficar com os seus problemas e preconceitos e jogar a culpa nas crianças. Não estou criticando o povo brasileiro. Só estou constatando uma reação que está me deixando muito assustado. Nós estamos no século 21, em 2015. E de repente as pessoas ficam chocadas com coisas que não se chocavam antigamente.

Gustavo Padrão (estudante de teatro): Qual é o papel da arte, não só da televisão, neste cenário que o país vive hoje?
Dennis Carvalho: Novela no país ganhou uma importância tão grande por não ter outros divertimentos que passou a ser a palavra sagrada em tudo. E não é, gente! A gente tem que voltar a atrás e ver que isso é um entretenimento! É mentirinha! É mocinho, bandido, pobre, rico… Se não, vai colocar em cima da gente, da novela, uma responsabilidade de decidir as coisas do país. Que não pode! É só ficção, entretenimento. Claro que a gente pode discutir isso, mas não colocar isso como a coisa principal de uma novela.

Gustavo: Mas você não acha que tem uma influência muito grande?
Dennis:
É isso que estou falando. Não deveria ter essa influência. Ou, então, as pessoas têm que entender que aquilo é divertimento, de mentira. Discutir futuro do país dentro de uma ficção é muito perigoso. Perigoso por quê? Você está lidando com público de mais de 30 milhões de pessoas, sei lá quantos milhões assistem novela no país… Por isso é perigoso se colocar isso em uma novela, no capítulo de uma novela. É importante que se entenda que é de mentira, que é brincadeirinha, que é ficção. Não é a vida!

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

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