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Crivella acusa a Globo de chantagem e de ser contra o Rio; emissora repudia

Mauricio Stycer

11/04/2019 21h35

O prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB), fez críticas pesadas à Globo em meio a uma entrevista coletiva improvisada, nesta quinta-feira (11). Incomodado com os questionamentos da repórter Larissa Schmidt, de que a cidade está parada à espera de medidas governamentais, o prefeito negou e, após ameaçar interromper a conversa, acusou a emissora de ser contra a cidade.

"É impressionante como a Rede Globo faz campanha contra o Rio. Não é contra mim, não. A cidade não está parada", disse. E repetiu: "É impressionante como vocês fazem oposição não a mim, mas ao Rio de Janeiro. É por isso que o presidente Bolsonaro já não dá mais entrevistas a vocês. E vários políticos também pensam assim".

Repetindo a mesma ideia pela terceira vez, acrescentou: "É impressionante como a Rede Globo de Televisão é absolutamente contra a cidade do Rio de Janeiro. É a televisão que anuncia o tempo todo os problemas do Rio, que faz drama sobre coisas corriqueiras, que acontecem na nossa vida desde que eu nasci aqui."

Foi neste momento, quando Larissa Schmidt quis saber se Crivella considerava "corriqueiro" o que ocorreu na cidade, que o prefeito afastou a repórter com um braço, dizendo que tinha o direito de não falar com ela.

O prefeito, então, se justificou: "A cidade do Rio de Janeiro, desde a minha infância, sofre problemas no trânsito. Esses, eu disse, são corriqueiros. São problemas que a gente enfrenta porque temos dificuldades com a nossa topografia. Nós somos uma cidade com muitas montanhas, muitos túneis, vias estreitas. E temos, sim, problemas com trânsito. É claro que os desabamentos procuramos evitar, mas nem sempre conseguimos. Lamentamos profundamente nossas tragédias".

E voltou atacar a Globo pesadamente: "Agora, é preciso aprender com elas (as tragédias) e não fazer campanha política. Não fazer exploração. O que a Globo quer é dinheiro na sua propaganda. O que ela quer é que a gente faça uma festa no Carnaval e ela possa vender R$ 240 milhões com a Prefeitura pagando todo o Carnaval. Isso está errado. Então o que elas fazem é chantagem. É chantagem! E isso não tem nada a ver com o interesse da cidade. E seguramente não vão colocar isso no ar".

Globo responde

O "Jornal Nacional" exibiu trechos das críticas de Crivella e leu uma nota oficial da Globo:

"A Globo repudia a atitude do prefeito Marcelo Crivella de afastar a repórter Larissa Schmidt dos jornalistas que cumpriam a obrigação de entrevistá-lo.

A Globo também repudia a afirmação de Crivella de que a emissora fez drama com coisas corriqueiras na cobertura jornalística do temporal de segunda-feira.

A Globo cobriu uma tragédia que tirou a vida de dez cariocas. E cumpriu a obrigação jornalística de mostrar que a prefeitura demorou a acudir a população. Um fato reconhecido pelo próprio prefeito, num momento raro de autocrítica.

A Globo lamenta também as declarações descabidas de Marcelo Crivella quanto ao Carnaval.

A Globo compra os direitos de transmissão das escolas de samba – e paga um valor quase seis vezes maior do que aquele que elas recebem de subvenção da prefeitura.

A Globo se solidariza com a repórter Larissa Schmidt e, mais uma vez, com os cariocas. Em especial, com as famílias dos mortos na tragédia."

Outras reações

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro "lamentou a atitude do prefeito" em nota:

"Cabe a toda e qualquer autoridade atender aos questionamentos da imprensa, que visa esclarecer à população sobre as medidas do poder público. Eventuais atitudes que cerceiem o trabalho das equipes de reportagem comprometem o direito de a população avaliar o trabalho da administração municipal, tanto no que diz respeito aos aspectos positivos, quanto aos negativos.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro se solidariza com todos os profissionais de imprensa presentes à entrevista coletiva, que se viram prejudicados com a suspensão repentina da prestação de contas à população carioca, por parte do prefeito Marcelo Crivella."

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo lembrou que Crivella é "sobrinho de Edir Macedo, proprietário da Record TV, emissora concorrente da TV Globo" e disse: "A Abraji considera a atitude do prefeito diante dos questionamentos de Larissa Schmidt incompatível com seu cargo. Agentes públicos têm o dever de fornecer informações sobre suas atividades e de respeitar o trabalho dos jornalistas de levar tais informações ao público. Discriminar meios de comunicação é antidemocrático e fere a liberdade de imprensa."

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

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