Entenda por que jornalista da Rádio Guaíba não pôde questionar Bolsonaro
Numa eleição marcada por cancelamentos de debates, vários episódios de ameaças a repórteres e a demissão inesperada de um comentarista político, o gesto do jornalista Juremir Machado da Silva ganhou significado especial. Ele abandonou um programa ao vivo na manhã de terça-feira (23) protestando que foi censurado, e impedido de fazer perguntas, durante uma entrevista de Jair Bolsonaro à rádio Guaíba, em Porto Alegre.
"O silêncio de vocês [jornalistas] foi uma condição do candidato que queria conversar com o apresentador", disse o apresentador Rogério Mendelski aos três profissionais que o acompanhavam no estúdio. "Nós podemos dizer que o candidato nos censurou?", perguntou Machado. "Ele [Bolsonaro] não sabe que vocês estão aqui. Ele disse 'dou entrevista só para você'. Não tem censura", respondeu Mendelski. "Eu achei humilhante e por isso estou saindo do programa, foi um prazer trabalhar aqui dez anos", replicou o jornalista, antes de se levantar e abandonar o estúdio.
Procurado pelo blog, Machado procurou esclarecer o episódio. "Foi um gesto espontâneo diante de uma situação jornalística pontual. Não gostei de saber durante a entrevista que não poderia perguntar por imposição do entrevistado", disse. Machado deixou o programa, mas segue trabalhando na rádio Guaíba. "Não sofri censura da empresa. O programa, do qual eu participava desde 2008, aceitou uma condição que me pareceu inaceitável para ter o Bolsonaro".
As razões deste acerto é que não são claras. "Suponho que ele se lembre da última entrevista comigo (está no YouTube) em que batemos de frente", diz Machado. O jornalista fez duas entrevistas com Bolsonaro. A primeira, por telefone, em 2014, e a segunda, presencial, em janeiro de 2016. "Na primeira, perguntei o que tinha contra gays. Ele respondeu que nada tanto que estava falando comigo. Eu lhe disse que ser chamado de gay não é ofensa". Machado retomou o assunto na segunda entrevista. E eles tiveram o seguinte diálogo:
Machado: O senhor é ou não homofóbico?
Bolsonaro: Não sei se tem algum gay aqui. Por acaso, o senhor é?
Machado: Nós já tivemos uma discussão aqui no ar. Eu lhe perguntei, por telefone, o que o senhor tem contra os gays. O senhor disse: "Nada. Tanto que estou falando contigo". O senhor acha que eu sou gay. Quando é que o senhor vai sair do armário?
Bolsonaro: Você está achando que eu sou gay. Quem sabe, um dia eu saio. Me convença.
Machado: Então. Qual é o problema?
Bolsonaro: Fala das vantagens.
Machado: Não sei se tem vantagens. Mas por que não? Essa obsessão por homossexuais não detecta um problema de ordem psicanalítica?
Bolsonaro: A minha briga é e continua sendo o material escolar. Eu estou defendendo a família e mais que a família, a inocência das criancinhas.
"Acho que ele guardou má lembrança sem contar que a turma dele aqui me acha comunista", diz Machado. "Me acha comunista por eu sustentar que a violência brasileira decorre da desigualdade social". Perguntei se era possível afirmar que a exigência que não fizesse perguntas na entrevista desta semana seria uma decorrência dos encontros anteriores. O jornalista respondeu que não poderia fazer esta afirmação. "Dá para cravar que eles não queriam perguntas incômodas".
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