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Em tempo de eleição, “Amor & Sexo” debate com Bolsonaro mesmo sem querer

Mauricio Stycer

10/10/2018 07h01


Coincidência ou não, a estreia da 11ª temporada de "Amor & Sexo" nesta terça-feira (09), exatamente entre o primeiro e o segundo turno da eleição de 2018, acabou dando outra dimensão ao programa comandado por Fernanda Lima.

Com uma pauta progressista e liberal em matéria de sexualidade, feminismo e inclusão racial, entre outros tópicos, "Amor & Sexo" fez um contraponto claro e aberto à agenda conservadora, em defesa da família, defendida publicamente por Jair Bolsonaro (PSL).

Sempre que pode, como repetiu segunda-feira (08) no "Jornal Nacional", o vencedor do primeiro turno sublinha que a sua candidatura está do lado "da família brasileira, que tanto clama para que seus valores sejam respeitados". Na última quarta-feira (03), em entrevista no Rio, a apresentadora já havia confrontado abertamente este discurso. "Quem pode falar em nome da família brasileira senão ela própria? A gente tá um pouco cansado desse povo falando…", observou.

No episódio de estreia, como já ocorreu em outras temporadas, "Amor & Sexo" defendeu que "cota não é esmola", pediu maior "representatividade", propôs "banir racismo" e cobrou "respeito pra todo mundo". Num momento que ilustrou o discurso, dois homens se beijaram no palco.

Em algumas outras passagens, o programa reproduziu temas de compreensão mais difícil para o grande público, como um discurso sobre "objetificação do corpo" e outro em defesa do sexo seguro: "Usar camisinha também é um ato político".

São momentos em que o programa não consegue cumprir o que a própria Fernanda enxerga como um objetivo: "A gente precisa colocar esses assuntos para a televisão, numa linguagem que as pessoas entendam, assimilem, se divirtam. Que agrade as pessoas, mas não fuja dos temas, dos assuntos", disse na entrevista.

Como escrevi em 2017, às vezes "Amor & Sexo" abusa do didatismo e parece um "telecurso". Mas, de fato, em outubro de 2018, querendo ou não, o programa ganhou outra tonalidade. "A gente encontra discursos de ódio, absolutamente retrógrados, que vem com a intenção de se chocar com esta tentativa de liberdade. Mas acho que o bem vai vencer. Espero", disse ela.

Questionada sobre o seu voto no primeiro turno, Fernanda não disse em quem votaria, mas deixou claro sua oposição a Bolsonaro: "Priorizo na escolha o 'Ele não'. Qualquer coisa menos o fascismo", disse. E deu a entender que não votava em Haddad: "Eu sou a favor da democracia e da alternância do poder. Busco uma terceira via."

Observação (acrescentada às 12h): Alterei o título original deste texto ("Exibido em período eleitoral, Amor & Sexo debate abertamente com Bolsonaro") por concordar com a argumentação da Globo que ele poderia provocar um mal-entendido e passar a ideia de haver um debate real entre o programa e o político, o que não há (a afirmação do título não era literal, apenas sugeria uma imagem). A atual temporada foi inteiramente gravada antes da eleição.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.