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Jornalismo esportivo: Dois livros celebram o centenário de João Saldanha

Mauricio Stycer

04/11/2017 04h01


A importância de João Saldanha (1917-1990) para o jornalismo esportivo brasileiro pode ser medida de diversas maneiras. Cito três: os temas que abordou com pioneirismo e coragem, a influência que ainda exerce sobre profissionais de outras gerações e a atualidade de muita coisa que escreveu no calor dos acontecimentos, há 40 ou 50 anos.

Sobre este último aspecto, há uma verdadeira "Biblioteca João Saldanha" a comprovar o que digo. São livros que reúnem textos produzidos para o jornal do dia seguinte, mas que seguem interessantes e agradáveis de ler hoje, como "O Trauma da Bola – A Copa de 82" (Cosac & Naify) e "Vida que Segue – João Saldanha e as Copas de 1966 e 1970" (Nova Fronteira).

Mas nenhum se compara a "Subterrâneos do Futebol". Antes de ser jornalista esportivo, Saldanha foi diretor e técnico do Botafogo. Neste livro, ele conta inúmeras histórias de viagens que fez com o time de Nilton Santos, Didi e Garrincha, no final dos anos 1950, início dos 1960. É bom demais.

Publicado pela primeira vez em 1963, pela Editora Tempo Brasileiro, ganhou segunda edição, em 1980, pela José Olympio. Até que, em 1994, a editora Revan lançou uma terceira edição e mudou o título do livro para "Histórias do Futebol". A alteração foi justificada em "nota do editor": o título original, uma referência a "Subterrâneos da Liberdade", de Jorge Amado, teria ficado datado, "se perdeu no tempo".

Eis que em 2017, no ano em que se comemora o centenário de Saldanha, a editora Lacre tomou a iniciativa de lançar uma nova edição e resgatar o título original – "Os Subterrâneos do Futebol". O livro tem orelha de Andre Iki Siqueira, autor de "João Saldanha: uma Vida em Jogo", a mais completa biografia do jornalista, além de depoimentos de personalidades impactadas pela obra.

A data redonda (nasceu em 3 de julho de 1917, em Alegrete, no Rio Grande do Sul) estimulou o lançamento de um outro livro – "As 100 Melhores Crônicas Comentadas de João Saldanha". Organizado por Cesar Oliveira, criador da editora livrosdefutebol.com, a obra propõe um recorte original sobre o trabalho do jornalista.

Uma primeira parte reúne textos variados, de tempos diversos, nos quais Saldanha escreve sobre jogos marcantes e equipes de todo o país. Uma segunda parte centra-se em análises sobre a seleção brasileira. Um terceiro capítulo é dedicado ao Botafogo, time de sua paixão. E, por fim, uma quarta parte, intitulada "Zona do Agrião", mostra as diferentes preocupações do jornalista com a desorganização e outras misérias do nosso futebol.

Outra novidade é um comentário ao final de cada texto, contextualizando-os. Os pequenos textos são do próprio Oliveira, de Alexandre Mesquita e Marcelo Guimarães.

E tem também Sandro Moreyra

Aproveito que estou falando de Saldanha para comentar o lançamento recente da biografia "Sandro Moreyra – Um autor à procura de um personagem", de Paulo Cezar Guimarães, recém-publicada pela Gryphus.

Carioca, botafoguense doente, Sandro Moreyra (1918-1987) trabalhou por décadas no "Jornal do Brasil". Foi um dos melhores amigos de Saldanha, ao mesmo tempo em que tiveram inúmeros conflitos, como detalha PC Guimarães em seu livro.

Em sua biografia de Garrincha ("Estrela Solitária"), Ruy Castro responsabiliza Sandro Moreyra pela imagem que se cristalizou de que o jogador era um tipo ingênuo e bobo. O jornalista inventou muitas histórias não apenas sobre Garrincha, mas também sobre o goleiro Manga, entre outros.

No livro, PC Guimarães não esconde a má fama de Moreyra, mas valoriza também outros aspectos da carreira do jornalista – um cronista bem-humorado, com ótimo texto, que registrou uma época folclórica do futebol carioca.

Duas filhas de Sandro se tornaram jornalistas conhecidas: Sandra Moreyra (1954-2015), repórter da TV Globo, e Eugênia Moreyra, diretora da GloboNews. O livro de PC Guimarães será lançado na próxima quarta-feira (8) em São Paulo, na Blooks Livraria.

Comentários são sempre muito bem-vindos, mas o autor do blog publica apenas os que dizem respeito aos assuntos tratados nos textos.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.