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“Felizes Para Sempre?” mostra mais clichês do que surpresas na estreia

Mauricio Stycer

27/01/2015 05h01


"Felizes Para Sempre?", de Euclydes Marinho, estreou lançando de cara duas questões. Além do título terminar com um ponto de interrogação, o primeiro episódio também apostou em uma pergunta:"Onde colocar o desejo?".

A primeira questão é retórica: pelas chamadas do programa, o público já sabia que veria uma história de gente infeliz, insatisfeita nos seus relacionamentos amorosos, em busca de novas experiências e aventuras.

A segunda pergunta, "onde colocar o desejo?", procurou passar a impressão de que a série ambiciona alguma profundidade. Ela parece inspirada num verso de "Pecado Original", música de Caetano Veloso ("A gente não sabe o lugar certo de colocar o desejo"), que por sua vez evoca Sigmund Freud (1856-1939), o pai da psicanálise.

Estamos todos, o tempo todo, tentando encontrar respostas para essa questão, mesmo quando não pensamos a respeito. E "Felizes Para Sempre?" não ofereceu nenhuma pista original para respondê-la.

Apesar da bela embalagem, enxerguei mais clichês do que surpresas no primeiro episódio, que girou em torno do milionário Claudio e de sua mulher belíssima, Marília. Infeliz na cama, ele busca prazer fora de casa, enquanto ela se queixa com a terapeuta. Poderoso, ele corrompe ministros para conseguir conquistar obras públicas, enquanto ela se pergunta qual foi a última vez que transaram.

A escalação de Enrique Diaz e Maria Fernanda Cândido para os papéis é um grande acerto. Eles formam um casal improvável e inesperado. Mas os seus personagens já foram vistos em dezenas de histórias. Igualmente pouco original é a decisão de contratar uma garota de programa, Danny Bond (Paolla Oliveira), para "aquecer" o casamento – e já sabemos, pelas chamadas, que ela vai dar um nó na cabeça dos dois.

Como o tema sugere, e os trailers promocionais adiantaram, não faltarão cenas picantes. As exibidas na estreia chamaram a atenção pela qualidade, sugestão e bom gosto – algo que falta, por exemplo, nas repetidas cenas de cama do comendador José Alfredo e Isis, em "Império".

Em busca mais de efeito do que qualquer outra coisa, a Brasília que o diretor Fernando Meirelles mostra me pareceu totalmente afetada. Planos diferentes não são necessariamente planos bons – podem simplesmente acrescentar pouco à experiência de ver. Pior, como muita gente notou, usou-se sem cerimônia "referências" manjadas, como uma cena de "O Anticristo", de Lars Von Trier.

Este primeiro episódio buscou oferecer uma visão panorâmica do conjunto, sugerindo mais do que mostrando, no esforço de seduzir o espectador. Em dez episódios, acredito que "Felizes Para Sempre?" ainda tem muito para mostrar. Um outro casal de protagonistas, formado por João Miguel e Adriana Esteves, ainda nem mostrou a que veio. Torço para que a série surpreenda mais do que nesta frustrante estreia.

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Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.