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Mesmo abusando dos clichês, “Boogie Oogie” consegue parecer original

Mauricio Stycer

10/10/2014 06h03

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O horário das 18h tem sido, nos anos recentes, o mais bem servido pela Globo em matéria de novelas originais. Cito algumas entre as minhas preferidas: "Cordel Encantado" (2011), "A Vida da Gente" (2011/12), "Lado a Lado" (2012/13), "Meu Pedacinho de Chão" (2014).

"Boogie Oogie" se enquadra nesta categoria, mas de um jeito torto. Há muito tempo não via uma novela utilizar com tamanha sem-cerimônia os recursos mais batidos do folhetim e conseguir, mesmo assim, passar a impressão de frescor (veja abaixo, no álbum de fotos, 10 truques e clichês de "Boogie Oogie").

Há algumas explicações para isso. Nilson Xavier, em seu blog, apontou uma: a trama ágil. "Para manter o telespectador fisgado na história, o autor parece dar uma guinada na trama a cada bloco de capítulos. 'Boogie Oogie' é uma das poucas novelas em que se tem a sensação de que perder um capítulo faz falta sim", escreveu, com muita propriedade.

Acrescento a este ponto um outro, correlato: a edição intensa da novela. Repare que as cenas de "Boogie Oogie" duram muito pouco, raramente mais do que um minuto. Quando a cena precisa ser mais longa, ela é dividida, sendo intercalada com outras. O recurso também não é original, mas obriga o espectador a ficar muito atento.

boogieoogiediscussaoTodo capítulo de "Boogie Oogie" tem drama, correria, briga, gritaria, entra-e-sai, revelação, vai-vém, separação, mais drama, outra revelação, mais correria, tudo temperado com uma trilha sonora repleta de hits dos anos 70. É uma novela que exige preparo físico emocional para acompanhar (risos).

O texto de Rui Vilhena, assim como a estrutura da novela, consegue agradar mesmo reproduzindo o que há de mais comum nos diálogos. Inteligente, o autor reserva sempre boas tiradas para alguns personagens, em especial para a vilã Carlota (Giulia Gam) e para Tadeu (Fabrício Boliveira), o filho da empregada que, ajudado pela patroa, se formou em direito.

Vilhena também tem o mérito de, trabalhando sobre alguns tipos pouco originais, conseguir transformá-los em personagens com aparência nova. É o caso de Claudia (Giovanna Rispoli), por exemplo. Já houve muitas "pestinhas" em novela, mas nenhuma tão doida e objetiva quanto ela. É também o caso de Fernando (Marco Ricca), o marido rico e adúltero, que "administra" três mulheres ao mesmo tempo com uma cara de pau impressionante.

Depois de dois meses no ar, "Boogie Oogie" me parece escrita com o objetivo de provar que não é preciso, necessariamente, inovar para cativar o público. Dito de outra forma, é uma novela velha usando uma roupa nova que lhe cai muito bem.

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.