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“Gabriela” não deixa claro por que voltou

Mauricio Stycer

19/06/2012 06h01


A decisão de refazer uma novela é algo especial, muito diferente de aprovar a produção de uma nova obra. Vendo o primeiro capítulo de "Gabriela", exibido pela Globo entre 22h25 e 23h15 de segunda-feira, me perguntei mais de uma vez: por que a emissora decidiu refazer esta novela?

O sucesso da versão original é uma boa justificativa, mas não a única. Afinal, quantos sucessos nunca foram refeitos… Pensei em três possíveis razões para o remake.

A primeira, e mais óbvia, razão: por causa da personagem. Será? A novela exibida em 1975 permanece na memória afetiva do público, basicamente, por conta de Sonia Braga. É um destes casos em que personagem e atriz se confundem de tal forma na lembrança que seria muito arriscado, por conta do efeito da comparação, propor uma nova versão.

Mas novas gerações não a conheceram, alguém pode ter pensado. É verdade, e isso seria um bom motivo para o remake. Mas as novas gerações assistem telenovela? Às 23h?

A atualidade da temática, que mostra a hipocrisia da sociedade local de Ilhéus e a virulência do coronel manda-chuva, poderia ser um segundo argumento em defesa do remake. Tudo bem. Concordo. Mas não era necessário refazer "Gabriela" para mostrar isso. Estas são problemáticas que estamos cansados de ver em novelas, séries, filmes e minisséries.

Uma terceira razão: "Gabriela" é entretenimento de ótima qualidade. Na minha lembrança, sim. Foi. Mas o primeiro capítulo da versão de Walcyr Carrasco, dirigida por Mauro Mendonça Filho, não foi inspirador.

Convencional demais, na comparação, por exemplo, com "O Astro", remake dirigido pelo mesmo Mendonça Filho, em 2011, "Gabriela" chamou a atenção do público com seus efeitos de luz, mas não exibiu nenhum momento memorável, realmente de impacto.

Ao contrário, em diferentes momentos pareceu uma novela velha, apenas com roupa nova, providenciada pela tecnologia. É precipitado falar com base apenas em um capítulo, mas nenhum ator em especial chamou a atenção, Juliana Paes sorriu em todas as suas cenas, inclusive nas mais tristes, a aposta em Ivete Sangalo não convenceu e várias interpretações soaram caricatas.

Leitores me chamam a atenção para uma quarta razão, que teria sido negligenciada por mim: o cententário de Jorge Amado, comemorado este ano. Na verdade, acho que a efeméride ajuda na promoção da novela, mas não acredito que justifica, por si só, o investimento que está sendo feito.

Retomando a pergunta inicial, eu diria que "Gabriela" ainda não deixou claro por que voltou.

Em tempo: Para uma outra visão da estreia, veja o texto de Nilson Xavier. Para mais informações sobre a novela, veja o site especial do UOL. Para uma descrição do primeiro capítulo, clique aqui.

Atualizado às 10h, para comentar as observações de alguns leitores.

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.