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Morrissey faz protesto no lugar errado

Mauricio Stycer

12/03/2012 11h26

Sou fã dos Smiths, acho Morrissey um grande músico, mas fiquei com uma estranha sensação durante seu show, domingo à noite, em São Paulo – impressão de estar no lugar errado e na época errada.

Morrissey fez três protestos durante o show – contra a família real inglesa, contra o ditador sírio Bashar Al Assad e contra o consumo de carne. Nenhum deles comoveu a pequena multidão que lotou o Espaço das Américas.

Para o público, havia problemas de outra ordem, bem mais simples, com que se preocupar. Primeiro, o caos para chegar ao local do espetáculo. Sem nenhuma fiscalização, homens "vendiam" pedaços da rua por R$ 40 para quem tivesse a coragem de estacionar. Sob chuva, uma multidão fazia fila para entrar.

Lá dentro, refrigeração zero. Além do calor, os preços abusivos de sempre para beber uma água ou uma cerveja. O som chegava mal a quem estava no fundo do ambiente.

Já é uma tradição no circuito de shows internacionais em São Paulo. Paga-se muito – entre R$ 200 e R$ 340 – por um serviço de péssima qualidade.

"Ele quer seu dinheiro. Chega de ditadura! Não, não, não!", dizia Morrissey, falando do príncipe Harry, quando poderia estar falando de quem promove espetáculos nestas condições.

Todos os músicos de sua banda usavam uma camiseta vermelha com a inscrição "Assad is shit", uma referência a Bashar Al Assad, que vestiria bem, por exemplo, nos fiscais que não foram vistos nas ruas próximas ao Espaço das Américas.

Em outro momento de militância explícita, Morrissey cantou "Meat Is Murder", enquanto ao fundo eram exibidas imagens de aves e vacas a caminho da morte, tratadas com brutalidade terrível. Se tivesse projetado imagens do público tentando chegar ao show talvez fizesse mais sucesso.

Em tempo: Mariana Tramontina, do UOL, fez uma boa descrição do espetáculo aqui.

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.