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Flertando com o sensacionalismo em nome da audiência: o caso Eloá e o cinema

Mauricio Stycer

14/02/2012 17h32

O caso Eloá tem todas as características para render um bom filme de ação. Nele, obrigatoriamente, uma jornalista terá papel importante. Sonia Abrão entrevistou Lindemberg Alves por mais de 20 minutos durante o longo período em que ele manteve a ex-namorada sob cativeiro.

A lista de filmes com jornalistas em papéis principais, como herói ou vilão, preencheria várias páginas.  Em defesa de seu papel no caso, Sonia recorreu a um deles, "Quarto Poder", em especial a uma cena, na qual Larry King, que por anos manteve um talk show na CNN, entrevista um criminoso e ajuda a expor o seu perturbado perfil.

Costa Gavras mostra em "Quarto Poder" (1997) como um jornalista decadente (Dustin Hoffman) manipula, em proveito próprio, um ex-segurança desempregado (John Travolta), que mantém a ex-chefe em cativeiro.

A participação de Larry King funciona como um breve contraponto, a dizer que há uma ou outra exceção entre os abutres em busca de carne fresca para fazer sensacionalismo.

Trabalho menor do cineasta grego, é um dos muitos filmes que apresentam uma péssima imagem dos jornalistas de televisão. Cito outros dois, bem melhores, que mostram profissionais de mídia flertando com o sensacionalismo em nome da audiência.

Dez anos antes de Gavras, em 1987, James L. Brooks descreveu em "Nos Bastidores da Notícia" os conflitos dentro da redação de um telejornal, num momento em que aparência e entretenimento começavam a preocupar mais do que a informação propriamente.

O filme foi indicado a sete Oscars, mas não levou nenhum. O conflito se dá entre um jornalista sério (Albert Brooks) e um âncora  (William Hurt, foto acima) mais preocupado com o seu terno do que com a notícias que deveria ler. Numa das cenas mais fortes, há uma manipulação de imagens de maneira a sugerir que o âncora chorou durante uma entrevista.

A mesma questão foi tema, dez anos antes, de "Rede de Intrigas", de Sidney Lumet. O filme ganhou quatro Oscars em 1977 com a história do âncora de um telejornal que, ao vivo, ameaça se matar logo depois de saber que será demitido por causa da baixa audiência do programa que apresenta. A cena faz o Ibope do noticiário disparar, levando os executivos da emissora a mudar de ideia quanto à demissão.

Peter Finch (foto) ganhou o Oscar pelo papel, mas foi premiado postumamente pois morreu um mês antes da cerimônia.

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.