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Sem o apoio dos jogadores, João Sorrisão seria apenas uma ideia cretina

Mauricio Stycer

31/07/2011 15h26

As gracinhas de Tadeu Schmidt no "Fantástico", as piadas de Tiago Leifert no "Globo Esporte" e o João Sorrisão no "Esporte Espetacular" são sinais evidentes de uma mudança de postura, mas não necessariamente de rumo, do jornalismo esportivo da Rede Globo.

Os índices de audiência e as pesquisas internas devem estar corroborando estas iniciativas. O seu impacto, porém, ainda não está claro e é motivo de muita discussão entre jornalistas e, também, estudantes de jornalismo.

Já fui questionado diversas vezes, em palestras com estudantes, sobre o que penso. Também já escrevi alguns textos a respeito. Recentemente, o jornalista Felipe Paranhos me procurou para falar sobre o assunto. A reportagem, que inclui uma opinião minha, foi publicada na revista eletrônica "Só".

Com o consentimento de Paranhos, publico abaixo a íntegra da nossa conversa, ao longo da qual, acho, consigo esclarecer algumas coisas que penso sobre o tema:

Como você analisa a forma com que a Globo conduz a cobertura esportiva atualmente, menos calcada no jornalismo e mais ligada ao entretenimento, com gracejos e piadinhas?
Discordo que a cobertura esportiva da Globo seja "menos calcada no jornalismo e mais ligada ao entretenimento". Acho que é possível fazer bom jornalismo com bom humor. Lamento, de fato, que a emissora esteja dando menos atenção do que poderia aos diferentes bastidores relacionados à Copa do Mundo de 2014, CBF, Ricardo Teixeira e Fifa. Se Tiago Leifert apresentar, por exemplo, uma reportagem sobre a repercussão das declarações de Teixeira à revista "Piauí", não me importa se faça isso com ou sem humor, fazendo ou não gracinhas.

Me parece que, ao menos nessa tendência atual da Globo, Tadeu Schmidt foi quem primeiro conseguiu conquistar o público, fazendo com que a emissora replicasse o formato "novos gols do Fantástico" para os outros programas esportivos da TV. E já há clones até nas rivais, como o quadro "Isso é Dantesco", da Band. A tendência ao esporte como entretenimento pode matar o jornalismo esportivo na TV aberta?
A transmissão de uma partida é um evento complexo porque mistura, de fato, entretenimento e jornalismo. O narrador, acredito, tem mesmo uma função de "animador", mas precisa ser auxiliado por jornalistas, que trazem informação. O segredo é manter equilibrada estas duas, vamos chamar assim, "porções" do espetáculo. Da mesma forma, não vejo problema na apresentação dos gols em forma de "show", como faz Tadeu Schmidt, no "Fantástico". Acho chatíssimo, mas não vejo comprometimento da informação. O problema, na minha opinião, ocorre quando a informação é deixada de lado, e prevalece apenas o entretenimento, por força de algum motivo externo que desconhecemos.

Você disse no post do João Sorrisão que a rápida resposta dos jogadores à promoção do "Esporte Espetacular" demonstra o poder de alcance da Globo. Essa semana, a Glenda criticou, no tom de brincadeira/jocoso de todos os esportivos da TV, o fato de Rivaldo ter rejeitado comemorar como o joão-bobo. Essa política, aliada ao fato de que muitos torcedores não gostariam de ver os gols do seu time comemorados do mesmo jeito, pode se voltar contra a Globo de que jeito?
Escrevi um texto sobre isso. A Globo não tem culpa alguma se um número considerável de jogadores atendeu sua sugestão e está comemorando os gols imitando o João Sorrisão. Acho a ideia cretina, mas todos nós já tivemos ideias cretinas na vida. O problema, acho, vai ocorrer se este tipo de comemoração se tornar hegemônico. Já imaginou os gols da rodada, exibidos no Fantástico, sendo comemorados, todos, como João Sorrisão? Seria um tédio…

Sobre o autor

Mauricio Stycer, jornalista, nascido no Rio de Janeiro em 1961, mora em São Paulo há 30 anos. É repórter especial e crítico do UOL. Assina, aos domingos, uma coluna sobre televisão na "Folha de S.Paulo". Começou a carreira no "Jornal do Brasil", em 1986, passou pelo "Estadão", ficou dez anos na "Folha" (onde foi editor, repórter especial e correspondente internacional), participou das equipes que criaram o diário esportivo "Lance!" e a revista "Época", foi redator-chefe da "CartaCapital", diretor editorial da Glamurama Editora e repórter especial do iG. É autor dos livros "Topa Tudo por Dinheiro - As muitas faces do empresário Silvio Santos" (editora Todavia, 2018), "Adeus, Controle Remoto" (Arquipélago, 2016), “História do Lance! – Projeto e Prática do Jornalismo Esportivo” (Alameda, 2009) e "O Dia em que Me Tornei Botafoguense" (Panda Books, 2011).

Contato: mauriciostycer@uol.com.br

Sobre o blog

Um espaço para reflexões e troca de informações sobre os assuntos que interessam a este blogueiro, da alta à baixa cultura, do esporte à vida nas grandes cidades, sempre que possível com humor.